Esse texto foi copiado do blog do Michel Helal, grande jogador carioca. O link para o blog dele é: http://michelhelal.wordpress.com/

Nesse artigo, ele fala sobre a profissão de jogador de poker. Leiam que é bem interessante.


"PROFISSÃO TRADICIONAL

Para melhor explicar, vou começar comparando algumas profissões. Escolhi 3 profissões: Comerciante, Médico e Corretor de Ações. São três profissões bem diferentes no que se diz respeito as qualidades necessárias para se ter sucesso. A maior similaridade é que em todos os casos, o retorno não será imediato. Todos terão que investir dinheiro e tempo, alguns com um risco maior que o outro. A diferença está sempre no caminho traçado, na expectativa de retorno que cada profissão tem e no risco que cada uma apresenta a curto e longo prazo.

A primeira diferença é a questão do tempo investido para se iniciar na profissão. O comerciante tendo o capital ele pode investir na área dele e abrir a sua empresa; o médico e o corretor de ações precisam de diploma/certificado antes de poder trabalhar em sua área. Para adquirir esse diploma o médico e o corretor de ações precisam estudar muito mais que o comerciante e o investimento é feito em sua educação. O comerciante em muitos dos casos precisa ter astúcia, ser um bom empreendedor e ter um amplo conhecimento do seu mercado.

O próximo aspecto é o retorno salarial, incluindo a segurança futura. Eu exponho a parte de segurança porque o médico é o único que dispõe de trabalho garantido pelo resto da vida, ou seja, salário garantido. O comerciante precisa ter sucesso com o seu negócio, e o corretor de ações depende muito do seu conhecimento de investimento em ações para também garantir o seu retorno. Independente da questão de segurança, para alcançar um retorno salarial maior, todos terão que se tornar empreendedores: o médico abrindo seu escritório, o comerciante expandindo ou lançando novos produtos ou serviços, e o corretor de ações diversificando seus investimentos. A segurança de um trabalho também vem com os benefícios que este inclui, como aposentadoria, FGTS, bônus salarial, décimo terceiro salário, seguro desemprego e outras coisas.

Como já tinha citado o tempo é um dos fatores mais importante de todas as profissões acima. O médico além de investir tempo, ele também tem que investir dinheiro na sua educação. Mesmo sendo a profissão mais segura ao longo prazo, é a que mais demora a apresentar um retorno sólido. O corretor de ações também tem uma profissão muito boa, porém ele depende de forças externas: economia do país, empresas que não distorcem seus ganhos e sejam verdadeiras com seus investidores. Portanto é difícil escolher a melhor profissão, pois todas têm seus prós e contras, e todas dependem muito do indivíduo que estará exercendo-a. Claro que não me aprofundei muito em relação a cada profissão porque iria além do que é necessário para esse artigo.

PROFESSIONAL POKER PLAYER

Agora que escrevi sobre algumas profissões tradicionais, vou falar sobre o que eu faço e porque você tem que me tratar com seriedade quando falo que sou um Jogador Profissional de Poker. Primeiro vamos começar com algumas dúvidas e perguntas que eu escuto todos os dias.

Fulano A – O que você faz?
Eu – Sou jogador profissional de poker.
Fulano A – Não, to falando sério o que você faz?
Eu – {sem saco de explicar} É estava brincando, sou investidor.

Fulano B – É verdade que você joga baralho apostando de verdade?
Eu – É sim.
Fulano B – Mas como que você saca o dinheiro?
Eu – Existem métodos: depósito bancário ou retiro com um cartão especial.
Fulano B – É melhor você sacar o que você ganhou logo, porque depois passa a sua fase de sorte e você fica sem nada. O avô do meu primo de segundo grau perdeu a casa e todos os seus bens em jogo.
Eu – {sem resposta mudo de assunto}

Fulano C – Você ganhou quanto hoje?
Eu – Hoje eu tirei uns $130.
Fulano C – Mas quanto você perdeu?
Eu – {sem resposta mudo de assunto}

Essa são algumas das conversas que eu tive nos últimos meses em relação a minha profissão. Eu não culpo essas pessoas, elas não sabem do meu cotidiano e não sabem exatamente o que envolve o poker. A maioria nunca ouviu falar e as que ouviram falar são influenciadas incorretamente pela mídia ou confundidas por situações familiares onde a pessoa realmente extrapolou em jogos de sorte, que não é o caso do poker. A natureza das pessoas é achar que em um jogo de cartas o que prevalece é a sorte. Portanto essas mesmas pessoas sentem dificuldade em acreditar que o poker pode ser uma profissão.

O poker é um jogo de estratégia mental que usa o baralho como forma de disputa. A pessoa que menos cometer erros, e que souber melhor se aproveitar das deficiências do adversário se torna o vencedor. O importante de tudo é saber que no poker o adversário é sempre outro ser humano. Isso difere dos jogos de sorte como blackjack, ronda, roleta, e outros onde “a casa” sempre tem uma vantagem. No poker existe o fator chance, mas o que predomina é saber usar essa chance a seu favor distinguindo situações com expectativa positiva ao longo prazo. Esse artigo no entanto não tentará explicar sobre poker e sim tentar desmistificar a idéia que um jogo de cartas não pode ser tratado como profissão.

Em quase tudo na vida para se ter sucesso, dedicação é fundamental. Isso serve para qualquer profissão, desde o médico ao comerciante, e não é diferente com a profissão poker. Primeiramente, é imperativo que o profissional se aprofunde e estude para que a evolução aconteça. É natural que alguém ache que depois de aprender as regras que você já saiba como praticar a profissão. Infelizmente não funciona desta maneira. O médico estuda, depois prática, e se especializa para depois prosseguir na sua profissão. O comerciante não leu um livro que diz como ele irá ter sucesso, ele trabalha para adquirir experiência e ao longo do tempo investe a sua experiência na sua empresa. Para ser um jogador de poker profissional é preciso muito estudo, muita prática, e depois muito estudo, mantendo esse ciclo por muito tempo.

A primeira falácia que quero destruir é que o que eu faço é fácil. Portanto, o dinheiro que eu faço vem com facilidade, e por isso eu posso perder ele com facilidade. Antes de decidir por me tornar um jogador profissional eu joguei por 3 anos, li mais de 10 livros sobre o assunto, passei muito tempo lendo artigos de jogadores que já praticam essa profissão e tem sucesso, investi horas na frente de um computador praticando o que eu hoje chamo de profissão. Não foi da noite para o dia, não foi sem antes ter demonstrado capacidade de manter um lucro por um longo prazo. Por mais que pareça algo inacreditável, essa profissão não é uma daquelas promessas de te deixar rico em 10 dias, com poucas horas investidas por dia. A dedicação no estudo da profissão, a disciplina para aplicar os ensinamentos e a experiência adquirida com a pratica é de total importância para o sucesso.

A sociedade em que vivemos se transforma quase diariamente. Ninguém imaginava a revolução que o computador traria para a sociedade, logo a Internet diminuiu fronteiras e também revolucionou o mercado de empregos, entre outras coisas. Todos temos que aceitar e compreender essa revolução. Lembro quando passava umas 5 horas na frente do computador aos 15 anos de idade e minha mãe me mandava parar e fazer algo produtivo. Aos 21 anos eu já me tornaria um analista de sistemas. Se eu fosse me deixar influenciar pela minha mãe, talvez não teria conseguido uma segurança financeira cedo na minha vida.

Uma das frases que eu mais escuto hoje em dia é “Você vive colado na frente desse computador, vai fazer algo produtivo”. Quando pesquisei essa palavra no dicionário ela se define como quem produz, ou pode produzir; lucrativo, rendoso. Portanto quando passo horas estudando sobre o jogo, eu estou sendo produtivo por estar buscando uma maneira de poder produzir. Quando passo duas ou três horas na frente do computador praticando minha profissão, eu me torno lucrativo e com isso produtivo. Tão logo me confronto com pessoas que me julgam pela “falta de produtividade”, mas eu sou mais produtivo que elas. Enquanto a maioria das pessoas recebe algo em torno de R$6 a R$13/hora, eu consigo quase que 4x esse valor. A única diferença é que a minha profissão não é tradicional e foi criada nos últimos 10 anos.

O pior preconceito é aquele que vem das pessoas que não entendem nada do que eu faço e me julgam um viciado. Então porque julgam? Será que essas pessoas falariam isso para o médico que dá plantão de 24hrs, ao nadador recordista olímpico que nada 10km todos os dias, ou ao investidor da bolsa de valores que passa 14 horas alternando entre as bolsas de outros países e a do país dele? Confundir vício por dedicação é muito simples, mas a diferença entre as duas é grande. O viciado não tem controle algum, está sob efeitos da sua “droga” e deixa que essa dite as suas ações. O dedicado é produtivo com o seu tempo e sabe que o retorno é maior quando existe dedicação.

Na maior parte as pessoas tem medo do que não conhecem. Quando me comparo a um investidor da bolsa ainda sou visto como um maluco viciado. Não pelo jogo, mas pelo risco que eu assumo. O melhor de tudo é que as pessoas que mais arriscam são as que têm o maior retorno. Cada um tem a sua habilidade para compreender os riscos e aceitá-los, mas o mais importante é reconhecer situações favoráveis e se aproveitar dessas sem medo de sofrer a dor do risco assumido. A sociedade em geral tem medo de aceitar algo novo e por isso passamos por uma provação. Eu aceito o risco da minha profissão, e vou além, tentando mostrar as pessoas interessadas que o que eu faço é lucrativo e que não é diversão. Pois a maioria confunde e acha que estou me divertindo quando estou à frente do computador trabalhando.

Sei o quanto terei que batalhar para que essa profissão seja ainda mais aceita. Continuarei sem saber o que falar para a maioria. Sofrerei com o descaso de alguns e o preconceito de outros. Mas enquanto isso vou criando o meu pé de meia, vivendo um estilo de vida que depende apenas da minha disciplina. E no futuro espero não ter que provar mais nada a ninguém."

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